Fui visitar dona Lúcia, uma senhora de mais de 80 anos, que me recebeu com muita alegria. Falou com certa satisfação que se sente bem em sua própria casa, lendo bastante, dividindo o espaço com a de suas filhas e recentemente voltando a cozinhar. Disse que, por preguiça, havia deixado os quitutes de lado, mas resolveu se rebelar contra o desânimo. Não tem vontade de ir para a cozinha todos os dias, mas também não quer ficar no quarto o tempo todo, presa à televisão e ao ventilador.
Ela confessou que tem medo de se tornar inválida e de que os filhos a coloquem numa casa de idosos. Eu até argumentei que hoje esses lares são como casa mesmo, só que mais amparados por profissionais e ela respondeu que nada é igual à casa da gente. Eu concordei, e entendi a ânsia daquela senhora em se mostrar útil, uma senhora que sempre foi ativa. A conversa foi interrompida pela chegada de um dos seus filhos, que ouvia parte do diálogo.
Ele disse: “Mamãe, a decisão de ficar aqui ou ir para qualquer outro lugar não será nossa. Temos o privilégio de tê-la conosco, de compartilhar seu tempo e seu carinho, enquanto você assim permitir, para a gente isso é uma satisfação”. Ela nos convidou para provar do bolo de nozes que fez pela manhã. Ali, ficou claro que sua luta não era apenas contra o desânimo, mas pela permanência do afeto, pela certeza de que sua presença ainda fazia diferença.
Filhos e netos, às vezes isso também tem que ser dito aos nossos pais e avós.