Dona Marisa é salgadeira. Acorda cedo, faz suas orações, prepara o café do marido e começa o dia entre panelas, cheiros e lembranças. Enquanto atende aos pedidos das clientes, já planeja os biscoitos e doces do fim de semana, quando os netos vêm visitar.
Eles chegam alegres, correm pela casa, enchem os potes com as guloseimas preparadas com tanto carinho e, sem saber, levam mais do que comidas, levam amor, cuidado e memória.
Mas entre uma fornada e outra, dona Marisa me contou um medo. Disse que teme o dia em que os netos crescerem e deixarem de ir: sofre por antecipação.
Quando perguntei se não era um sofrimento inventado, ela respondeu com sabedoria e dor: “Qual de nós não sofre por antecedência?”
Ela sabe que ainda é cercada de vida, de gente, de rotina, mas também sabe o quanto é real o medo da solidão e reconhece que, enquanto sofre por algo que nem aconteceu, perde tempo, não é?
Lembrei a ela o que dizia Séneca: “Sofremos mais da imaginação do que da realidade”.
Talvez o segredo esteja nisso, em viver o agora antes que a mente nos roube o presente.
