O escritor moçambicano Mia Couto costuma dizer que o medo foi um dos seus primeiros professores. Antes mesmo de confiar nos anjos, ele já se assustava com monstros, fantasmas e demônios.
Quando os anjos enfim chegaram, vieram como guardiões da alma. Mas esses protetores confundiam sentimento com realidade. Recomendavam desconfiar dos estranhos, quando muitas vezes o perigo estava bem perto, entre pessoas conhecidas.
Na infância, Mia aprendeu que era mais seguro não atravessar fronteiras, nem da língua, nem da cultura, nem do território. Só que esse medo o fez desaprender.
Ao deixar sua casa natal, carregou muros invisíveis que lhe roubavam a coragem de viver e a ousadia de ser ele mesmo. No fundo, descobriu algo simples. Há no mundo mais medo das coisas más do que coisas más em si.
A maldade existe, lógico, sabemos. Mas o medo, quando domina, encolhe horizontes e nos faz acreditar em fantasmas.