Um dia desses eu sentei com a minha mãe na cozinha da casa dela e fomos limpar a poeira de alguns álbuns de fotografia. Olha que coisa mais deliciosa, poder encontrar estas raridades preservadas. Ali ela se emocionou com as fotos do meu pai, conversou com a foto da minha tia, ambos já falecidos.
Lógico que as fotos vêm lotadas de memórias. Viagens num Fusca e numa Variant, os filhos pequenos e as fotos dela, jovial, de calça jeans, cabelos pretos embalados pelo vento de uma praia.
Ela pegou a foto e disse: veja só como envelheci. A foto devia ser de uns 40 anos atrás e ela ficou pensativa a respeito daquilo que ela viveu e que passou. Depois me disse: ainda bem que fiz tudo o que tive vontade. E faço até hoje aquilo que consigo. Ela está se preparando para ir a Maceió com minha irmã para o aniversário da sua cunhada, nossa tia. Olhei pra ela e dei um abraço, apertando a lateral da sua barriga com um beliscão, como gosto de brincar.
A minha mãe hoje tem os cabelos branquinhos. O rosto com as várias marcas que a vida esculpiu. Adora ser chamada para uma viagem ou um almoço fora. Quando liga para a gente, fala sobre os netos, dos livros que leu e encerra a conversa quase que com uma missa, de tanto que nos abençoa. Todas as vezes que saio de lá lembro das falas do Guimarães Rosa: a felicidade se encontra é nas horinhas de descuido.